Sonhos, cores e músicas: um review de Your Name

Sonhos, cores e músicas: um review de Your Name

“Eu estava sonhando, nunca consigo me lembrar, mas eu continuo sentindo que perdi alguma coisa importante muito tempo depois de acordar.”

Nos últimos dias, alguns amigos e eu conversávamos sobre sonhos, essa sempre é uma experiência divertida. Sonhos vêm em todos os formatos; alguns são engraçados, outros assustadores, uns não fazem sentido e outros… bem, fingimos que não têm sentido. Quando o assunto é sonho, algo que todos já devem ter experimentado é a sensação de não conseguir lembrá-lo depois de acordar, como na citação que inicia este texto. A frase vem de um filme, Your Name (Kimi no na wa), e eu gostaria de falar sobre ele.

A premissa básica encontrada na maior parte das sinopses pode dizer que se trata de um garoto e uma garota que ocasionalmente trocam de corpos quando sonham. Se você perguntar a um amigo, talvez ouça um resumo um pouco diferente e brincalhão: ele dirá que é um “Se eu fosse você” em versão anime.

Você pode se questionar, esse filme é bom mesmo? Sim.

Mas por quê? Bem, em parte porque a história é familiar e nova ao mesmo tempo. Esse é um filme comum, até certa altura, de descoberta adolescente onde pessoas jovens vivem experiências que as marcam e mudam seu modo de ver a vida. O filme começa quando uma jovem, Mitsuha, acorda agindo estranhamente. Sem receber muitos detalhes passamos para o dia seguinte, onde seus amigos comentam que a jovem não parecia ela mesma no dia anterior. Ao acompanhar sua rotina e frustrações, somos apresentados a seu desejo de ser um jovem morando numa cidade grande. Pois bem, quando o despertador toca no dia seguinte seu desejo se tornou realidade e ela acorda no corpo de um garoto de Tokyo, Taki. Diferente de outros filmes do gênero, as trocas não são permanentes, duram apenas um dia e, através dos relatos de seus amigos e mensagens deixadas quando trocam de corpos, logo os dois notam o que aconteceu, e o que se segue são cenas divertidas onde Taki e Mitsuha tentam lidar com a situação sem afetar tanto a vida um do outro. Isso permanece até que eles percebem que estão apaixonados, e resolvem se encontrar, encerrando assim o primeiro ato. Sim, primeiro ato. Se você conhece aquela velha divisão (apresentação do mundo, problema e solução) nota que há algo estranho. A percepção dos sentimentos é algo que costuma acontecer do meio para o final do segundo ato e fica claro: algo não está certo. Não vou continuar a falar do enredo, aqui é onde o filme começa de verdade e nenhum grande spoiler foi falado até agora, vamos para o próximo ponto, o visual.

Quem conhece o trabalho do diretor Makoto Shinkai sabe que, além das histórias focadas em relacionamentos humanos, outra de suas marcas é o uso das cores. Em 5 Centímetros por Segundo, ele usa uma paleta de cores com tons azulados e arroxeados puxados para o pastel numa tentativa de passar a tristeza e melancolia de seu protagonista.

Em O Jardim das Palavras, ele utilizou uma nova técnica de coloração para mostrar o reflexo da chuva nos personagens, somado a isso um uso de azul e verde, representando o frescor trazido pela chuva e o período da juventude.

No filme O Tempo com Você, o diretor, focou no cinza nas nuvens e chuva sempre presentes, seu objetivo era passar a preocupação com as mudanças climáticas, porém nem por isso é um filme escuro, ele também usou cores alegres, principalmente em cenas após a chuva para representar renovação e esperança.

Já em Your Name temos cores alegres, vibrantes e saturadas, com azul, verde, rosa e vermelho. Makoto Shinkai faz  uso dessas cores para representar o ambiente natural do Japão, como montanhas, florestas e rios. Também é interessante notar o uso de palhetas de cores diferentes para Taki, com azul e verde, e Mitsuha, com vermelho e laranja, a alternância de cores nas passagem de tempo e os contrastes nas dualidades de alegria e desespero, cidade e campo, sonho e realidade, e por último, morte e vida. Vale mencionar a cena da aquarela, que é simplesmente fantástica. Talvez seja o filme mais colorido do Shinkai, nele todas essas cores criam uma atmosfera mágica que encaixa bem com o elemento sobrenatural apresentado.

[A partir daqui, haverá grandes spoilers. Se preferir evitá-los, pode pular para o último parágrafo.]

Por último gostaria de falar sobre a temática do filme. Em Your Name, é abordado tema do destino e de como todas as coisas estão ligadas. Isso é facilmente percebido pela lenda japonesa do Akai Ito, o fio vermelho do destino que conecta pessoas e eventos. Os sonhos dos protagonistas, provavelmente, eram uma representação deste. Isso também pode ser percebido na música de abertura, “Dream Lantern¹”, que trata de um sentimento de anseio anterior a conhecer o outro e de sempre ter procurado a outra parte sem saber. Essa busca é acentuada na música “ZenZenZense²”, tocada quando os protagonistas alternam suas rotinas em cenas rápidas. Essa música fala de buscar o outro desde sempre, porém com o detalhe de não desistir e recomeçar a busca caso o destino afaste a outra parte. Isso dá início à temática de luta contra o destino. O clímax dessa luta é embalado pela música “Sparkle³”, que conta sobre efemeridades, sobre perder e sobre como, no final das contas, o destino não importa tanto quando as pessoas querem mesmo alguma coisa. A última música, “Nandemonaya⁴”, fala sobre a necessidade de seguir em frente, mesmo que “só mais um pouquinho”, quando já não aguentamos mais.

Esses temas podem parecer bobos e infantis para alguns, mas as pessoas gostam da ideia de conexão e lutar contra o destino. Quando digo conexão quero falar de estar ligado ou fazer parte de algo. Pode ser a família através do sangue, colegas de trabalho ou estudo por circunstâncias, amigos por gostos e hobbies, e por aí vai. Como diz John Donne, “nenhum homem é uma ilha”. Todos estamos conectados de alguma forma e lembrar disso é reconfortante. Quanto à parte de lutar contra o destino, isso pode variar de pessoa para pessoa, mas sempre estamos passando por algum tipo de situação onde as coisas podem parecer impossíveis ou extremamente difíceis e uma mensagem dizendo que talvez seja possível e vale a pena lutar é bem-vinda. Não se trata de positividade tóxica ou de dizer que todos os seus sonhos vão se realizar, mas que ter esperança e correr atrás é uma coisa boa. Esses elementos acabam fazendo com que o filme encontre eco em pessoas com os mais variados tipos de vivência, tornando-o popular.

Talvez não seja o melhor filme do mundo e nem seja um filme que vai mudar sua vida, mas é um filme divertido para ver com os amigos e esquecer dos problemas. Se estiver interessado pode ouvir os episódios do Contemporama onde Your Name é citado:

Espero que tenha gostado e o convido a aparecer por aqui nas segundas e sextas para mais textos.

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