Band of Brothers é mais que guerra.

Band of brothers é mais que guerra

Uma das maiores virtudes do ser humano é, sem dúvidas, a capacidade de amar. O amor é uma dádiva única, talvez a mais maravilhosa das dádivas, que capacita o homem a suportar as maiores dificuldades e até mesmo sacrificar-se em prol de outro, a despeito da mais adversa das situações. E isso é notável porque, se formos honestos, poderemos chegar à conclusão de que muitas vezes se sobressai outra tendência não tão legal em nossa constituição espiritual. Ora, nós, seres humanos, carregamos em nosso âmago o egoísmo inflexível e aquela predisposição nefasta à autopreservação cínica. O homem destituído de amor (não aquele exacerbado amor-próprio que corrói a nossa alma, mas o amor voluntarioso) está fadado a viver para si mesmo, está condenado a ser o mais mesquinho e desgraçado das criaturas deste mundo.

Convém salientar, ademais, que o amor não é um fim em si mesmo, porque quando nasce no terreno de nosso coração acaba por se multiplicar em outras muitas virtudes. O amor desemboca na coragem, na empatia, na amizade, na bondade, na paciência. E tudo isso toma conta de nossos membros e faz surgir as mais lindas e imponentes atitudes, as quais nos deixam, não raras vezes, encantados, impressionados e jubilosos. É um pouco curioso, porque mesmo homens moralmente deteriorados como nós conseguimos enxergar o valor daquelas ações motivadas por amor. O amor é de uma espécie teimosa, forte, resiliente. O amor, caro leitor, surge até mesmo naqueles locais que, à primeira vista, são destituídos dos bons valores.

Quando pensamos em guerra nos vem à mente em primeiro lugar a manifestação da doença humana, a perversidade, que teima em eclipsar e deteriorar a bondade no coração humano. É difícil enxergar no seio da guerra o amor, porque a guerra, por definição, é a antítese do carinho, da afeição, da afabilidade, do apreço, do bem-querer. Mas até mesmo ali é possível que o amor surja. É factível na guerra o amor entre desconhecidos que, com o tempo, faz desenvolver algo mais que uma simples amizade, mas uma verdadeira irmandade, um laço mais forte do que qualquer outro laço que nós, surgidos do pó, podemos nutrir. Algo como aquilo que Salomão diz em Provérbios: “Em todo o tempo ama o amigo, e na angústia nasce o irmão”.

É isso e muito mais que Band of Brothers, provavelmente a mais aclamada minissérie da HBO, nos apresenta. Antes de dar prosseguimento ao meu pensamento, deixe-me apresentar a minissérie em questão, que julgo eu, é a melhor produção já feita na história da televisão.

O QUE É BAND OF BROTHERS?

Sucintamente, Band of Brothers é uma minissérie com 10 episódios lançada em 2001 pela HBO, baseado em um livro homônimo escrito pelo historiador Stephen Ambrose, que adapta para a televisão a história da Companhia Easy, do 2º Batalhão, do 506.º Regimento de Infantaria Paraquedista, da 101ª Divisão Aerotransportada, que lutou na Segunda Guerra Mundial, no processo de libertação da Europa ocupada. A produção perpassa todos os momentos vividos pela Companhia Easy, desde o seu treinamento nos Estados Unidos e, posteriormente, na Inglaterra, passando pelo salto de paraquedas no famigerado Dia D na Normandia por trás das fileiras alemãs, pelo salto na Holanda sob a controversa operação Market Garden, pela Batalha das Ardenas até, por fim, a ocupação da Alemanha pelos aliados e o consequente final do conflito.

Os soldados retratados na minissérie eram basicamente voluntários, ou seja, pessoas comuns que decidiram fazer parte desta nova divisão de paraquedistas e, assim, lutar contra os exércitos fascistas que ameaçavam o mundo. Este aspecto é, também, interessantíssimo pois é revelado que pessoas comuns poderiam se tornar heróis, como bem salientou o Major Richard Winters, possivelmente o principal líder da Companhia Easy, em resposta ao seu neto quando este perguntou se o avô era um herói: “Não, mas servi numa companhia de heróis”.

Band of Brothers é um marco pela fidelidade, principalmente no que tange à ambientação e a veracidade, seja dos aviões, armas, tanques, até mesmo dos fatos ocorridos por cada personagem, que é, cada um deles, baseados em pessoas reais. Convém comentar também que a produção da minissérie foi mais cara do que o ótimo Resgate do Soldado Ryan!

Para te instigar a assisti-la, vale a pena dizer, ainda, que Band of Brothers foi indicada a 19 Emmys, ganhando 6 destes, além de 1 Globo de Ouro por “melhor minissérie ou filme para TV”, entre outros prêmios. É, em vista disso, uma obra premiadíssima, que merece estar na sua lista de produções que precisam ser vistas antes de morrer. E, sinceramente, acho que os prêmios foram poucos.

Finalmente, a trilha sonora é uma das mais maravilhosas. Sempre fico arrepiado quando ouço a música de abertura.

N

VOLTANDO AO AMOR

Para além dos atos de heroísmo, dos traumas e da grande pressão sofrida pelos combatentes no palco europeu da Segunda Guerra Mundial, de certa forma Band of Brothers celebra o amor nas situações complicadas, o amor apesar dos horrores da morte, da dor e do sofrimento. O que mais me chama atenção nessa obra é como, para além de todas as coisas vividas pelos combatentes americanos da Companhia Easy, eles se lembravam dos amigos e dos momentos em que passaram juntos. Isto é, para cada soldado, a questão mais importante em sua mente não era necessariamente as suas dores, mas as dores sentidas na companhia dos homens que eles aprenderam a amar, que se tornaram de fato seus irmãos.

No começo de cada episódio há um depoimento de alguns veteranos que narram as histórias que eles viveram na Easy, sendo tal ocorrido dramatizado em seguida pelos atores. A princípio não sabemos quem é cada velhinho, ou seja, qual personagem ele é representado na minissérie, mas é frequente alguns deles mencionarem seus amigos com quem dividiram no passado o fardo da dor e do perigo. Tudo se torna mais significativo no episódio especial que consiste somente nos depoimentos colhidos dos veteranos. É impressionante que mesmo depois de décadas eles continuavam chorando pelos irmãos que deixaram no campo de batalha e se emocionavam por terem estado ao lado das pessoas mais importantes de suas vidas.

Esse amor, pelo menos na minha experiência, continua sendo transmitido para mim. Acho que já assisti Band of Brothers cerca de 4 vezes, mas a cada vez que assisto compartilho com aqueles velhinhos a dor pelas perdas, a tristeza pelo sofrimento e, também, a alegria pela amizade teimosa que insiste em sobreviver em meio a bombas e tiros.

A resposta dada pelo aclamado Richard Winters ao seu neto, mencionada acima, revela, outrossim, este caráter doador. Dick, como era chamado, foi um candidato à medalha de Honra do Congresso por sua atuação no início da invasão à Normandia ao ter preparado o ataque que, com o auxílio de alguns soldados por ele escolhidos, desativou vários canhões alemães que castigavam uma das praias invadidas pelos aliados, impedindo a chegada de tanques. Tal ataque colocou em fuga uma força alemã muito superior ao grupo americano, sendo um grande sucesso. A inteligência do então tenente Winters, portanto, foi importantíssima para a operação do Dia D. A bem da verdade, Richard Winters foi importantíssimo não só nesse ocorrido, mas ao longo de toda a guerra. Ele acabou ganhando a Cruz de Serviço Distinto, a segunda medalha mais importante, contudo nunca se vangloriou disso. Dick atribuía o heroísmo visto em sua carreira militar aos soldados que lutaram ao seu lado e sob o seu comando, deixando de lado qualquer holofote que pairasse sobre si mesmo. Esta conduta é totalmente distinta do egocentrismo e do egoísmo humano, revelando, mais uma vez, aquele amor que floresce em meio a desafios tão implacáveis.

Richard Winters de Band of Brothers, à esquerda, e o real, á direita.

Outro exemplo é o de Robert “Popeye” Wynn, que, mesmo tendo sido atingido na manobra referida acima e ido para a retaguarda, fez de tudo para voltar à Companhia Easy para lutar junto dos seus amigos. Ele poderia ter passado mais tempo no hospital longe da loucura da guerra, visto que ainda não havia se recuperado completamente, mas ainda assim pegou uma surpreendente carona com o então odiado capitão Herbert Sobel e seguiu rumo ao front. Creio que só o amor pode impelir alguém a fazer isso.

A irmandade e a amizade nutrida pelos colegas duraram décadas após o fim da atuação da Easy no campo de batalha. Eles continuaram a se reunir para se relembrar dos momentos vividos juntos, até a morte de cada um deles. Imagine só: eles se lembravam de momentos árduos e tristes, momentos difíceis e sombrios. Mas apesar dos pesares, o amor misturado a estas circunstâncias era suficiente para mantê-los de pé e, então, colocar em seus rostos um sorriso. “Band of Brothers” é, afinal, um nome apropriado.

Sobre o autor:

1 comentário em “Band of Brothers é mais que guerra.”

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *