Lanterna de Mar, por: Guilherme Iamarino

Lanterna de mar

 por: Guilherme Iamarino | Publicado em 14/12/2021

“É cada vez mais difícil chegar aqui, Sören. Quase um ano construindo uma casa, puxa! Agora finalmente podemos juntar nossas famílias!” era Jens que chegara e abrira porta do farol. Um homem simples, por vezes com um falar gentil e sorridente. Com ele estavam sua esposa Helmi e sua filha Lena. Algumas malas e sacolas estavam à porta do farol, ao lado do grande carro coberto de pequenas camadas de gelo.

“Entrem! Entrem!” A voz de Sören ressoava como uma forte tuba. “Tempos difíceis chegando por aqui. O Natal este ano será rigoroso!” Acompanhava Helmi e Lena, auxiliando-as enquanto Jens ajeitava todas as malas e sacolas no pequeno hall de entrada da casa do farol. 

O farol, que se localizava no limiar de uma escarpa agreste com uma pequena casa anexada a ele. Era o nobre local de trabalho, casa e única morada de Sören por toda a sua vida. Sua construção era imponente, grandiosa. Alta, arredondada, com a escada circular rodeando até o topo, coberta e segura, protegendo os que a subissem das furiosas rajadas de vento e neve que se lançavam contra o farol de tempos em tempos. A tinta originalmente branca já estava fundida com alguns musgos e com o intemperismo natural, conferindo o aspecto mitológico daquela importante construção. Era extremamente antigo, um ancião de dias, mas sua majestade permanecia vívida. Certamente um pináculo da cultura humana, que, apesar de já ter visto dias melhores, continuava firme através das eras mesmo caído no isolamento.

“Que bom que chegaram!” A esposa de Sören alardeou, assim que avistou Helmi e Lena, as duas mulheres da nova família que iria morar na região do farol. “Pensei que teriam dificuldades na estrada e chegariam apenas amanhã! Mas graças a Deus que conseguiram chegar enquanto ainda está claro! Venham, venham! Estou terminando nosso ensopado, vocês devem estar com fome!” A velha senhora, de cabelos amaranhados e grisalhos, um rosto simpático e largo e roupas esvoaçantes agarrou as duas pequenas mulheres, a criança e a mãe, e logo as levou para a sala de jantar. Ela era aquele tipo de senhora que quando nos abraça envolve num tipo de buraco negro de acolhimento. Seu corpo era como uma colcha suave e quente num dia frio. Helmi e Lena, capturadas pela simpática mulher, rapidamente se dirigiram para onde a comida estava sendo servida. 

“Niels realmente adorará a companhia de Lena.” Sören comentou, admirando aquela cena com um sorriso de canto de boca. Assim que todas as mulheres deixaram o hall de entrada da casa do farol, pode finalmente falar diretamente para Jens o que realmente queria dizer. “Ele sente falta de alguém da idade dele para compartilhar a vida. 

Jens acenou com a cabeça, concordando. Não havia muito o que falar. Algo o havia impelido a aceitar aquele trabalho insalubre. Um sentimento que não conseguiu explicar muito bem a sua esposa. Quase que um chamado, daquelas convocações interiores que só você e quem realmente te conhece muito bem sabe. Ele e Helmi tiveram várias conversas, discussões nas noites em claro para tomar aquela decisão. Amavam o serviço e tinham se apegado àquela família desde a primeira visita ao farol, durante as entrevistas e a fase preparatória de Jens, mas sabiam que morar naquela região seria um enorme desafio. Lena jamais veria outras crianças com frequência, cresceria sem ver os grandes desenvolvimentos tecnológicos, ao lado de um casal de idosos e seu neto. 

O farol era localizado em um dos pontos mais isolados da Islândia, face ao mar que leva à Noruega. Você poderia chegar até ele por dois caminhos, um pequeno porto que ficava logo abaixo de uma falésia, uma queda de 20 metros, ou então pelas estradas tortuosas do continente. Pelo porto, os navegantes corriam o risco de sofrer nas arrebentações do mar, e seus barcos se quebrarem nas rochas costeiras, e após isso terem que subir até o farol entre os apoios nas rochas e escadas estreitas que foram construídas ali através dos séculos. Pelo continente havia apenas uma única estrada que beirava o gélido mar. Não havia praias, apenas as grandes quedas provocadas pelas falésias e o barulho do mar chocando-se contra as rochas. Seguindo pela encosta, depois de infindáveis quilômetros ouvindo o rugido marítimo de um lado e o vento soprando pela vastidão do planalto de outro, o viajante chegaria a um caminho de pedras lapidadas e organizadas, desembocando em uma pequena cidade portuária, que vivia da pesca, da fabricação de redes e de uma pequena agricultura local. Era a conexão mais próxima entre a civilização humana e aquele farol. Tal distância e dificuldade desencorajariam até mesmo o mais ousado dos aventureiros e colocaria temores nas mentes mais preparadas. 

Mesmo com todas as dificuldades de uma vida insipidamente isolada, uma família morava ali na pequena casa que ficava ao lado daquele antigo farol. Era uma pequena equipe de três pessoas. Um velho, sua esposa e seu pequeno neto. Eram eles os responsáveis por manter acesa a lâmpada do farol, que avisava todos os viajantes dos perigos do mar e das encostas traiçoeiras do norte da Islândia. Mantinham acesa a lâmpada da humanidade para as futuras gerações, até a última chama. Estes eram Sören e sua esposa, juntamente de seu pequeno neto, Niels. 

“Estou feliz que tenha aceitado o trabalho, Jens” Sören chamou a atenção de Jens, que estava pensativo enquanto trocava os olhares entre a lareira recém-acesa e a janela que dava para a encosta do farol. As ondas estavam fortes naquele dia e havia uma camada de neve caindo e pairando no ar sendo levada com o vento. Era possível ver daquele ponto que o pequeno porto no final da falésia já estava totalmente submerso. Ventos fortes estavam por vir.

 

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